quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Sessão 24 - Sobre aprender a ler pelo prazer de ler

              Desde o momento em que minha mãe descobriu que estava grávida, ela leu para mim. Ela me contava histórias sobre princesas, pessoas vivendo histórias maravilhosas e passava o dia inteiro contando o que me esperava. Como ela não sabia se eu era um menino ou uma menina, ela brinca dizendo que contava histórias que pudesse agradar aos dois públicos. Esse foi o meu primeiro contato com uma narrativa. Na barriga. Antes de saber o que era palavra. Antes de saber o que era uma história. Antes de poder guardar um dos momentos mais sublimes da minha vida na memória. Quando eu nasci, minha mãe se debruçava sobre o meu berço e lia livrinhos infantis, ela conta que era a forma mais fácil de conseguir manter meus olhinhos abertos, ela se gabava que a filha dela entendia cada palavra. Mas eu acho que eu só entendia a beleza de se ter uma mãe lendo para você. É claro que não lembro desses momentos, mas em  minha imaginação, posso enxergar a minha mãe naquela cena... Não há nada mais bonito. 
          A medida que fui crescendo, as histórias passaram a ser contadas antes de dormir, ela se deitava ao meu lado, aninhada em seus braços, com suas mãos brincando com o meu cabelo, ela me contou sobre a pequena vendedora de fósforos, em uma noite fria, se esquentando com cada palitinho; leu a história de uma florzinha que se apaixonara pelo sol; recitou os versinhos de Cecília Meireles; me permitiu conhecer o mundo mágico onde ninguém jamais envelhece e os crocodilos fazem tic-tac; leu para mim todos os livros que ela poderia. Até mesmo quando ela viajava, ela me ligava para que pudessemos ler as nossas historinhas antes de dormir. Naquela época telefone era uma fortuna, mas ela não se importava. A maior fortuna era aquele momento. Um dos melhores da minha infância. Um dos melhores da minha vida.
           Foi assim que, lentamente, aprendi as primeiras palavras. Aprendi a ler antes de todos da minha sala. E quando, aos 4 anos, comecei a juntar algumas sílabas, minha mãe começou a dividir ainda mais as doces histórias dos livros comigo. Eu lia uma linha, ela lia quatro, eu lia duas linhas, ela lia três, eu lia três linhas, ela lia duas, eu lia quatro, ela lia uma. E, então, chegou o dia em que eu passei a ler para ela. Toda noite, eu caminhava até ela com um livrinho, me aninhava em seus braços, pegava nos cabelos dela e contava para ela as doces histórias que existiam nos livros. Aqueles livros que guardaram nossa história. Não há momento de minha vida que se asemelhe ao momento que minha mãe criou comigo. Sempre serei grata pelo carinho com que ela tratou a minha educação (doméstica e escolar). Por ter sido uma mãe exigente, carinhosa, companheira e que fez com que eu percebesse que há um momento do dia destinado ao prazer e esse prazer está em ler. E dividir essas leituras com quem se ama.
 

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